Na política, as últimas eleições mostraram que manda a tradição dos clãs e dos vínculos afetivos. Só no Congresso Nacional, 49% dos eleitos, quase a metade, são netos, filhos, irmãos, sobrinhos ou casados com quem exerce ou já exerceu algum cargo eletivo. A situação se agrava ainda mais quando observado o quadro dos jovens parlamentares – que têm menos de 35 anos. Nesse grupo, o percentual de parentes ou cônjuges sobe para 85%.
O estudo completo sobre o perfil “genealógico” do novo Parlamento foi elaborado pela Organização Não Governamental (ONG) Transparência Brasil, que detalha cada caso em um total de 17 páginas.
Há exemplos de “herança” eleitoral nos principais partidos políticos. Na Câmara dos Deputados, o PMDB, o PTB e o SD lideram o percentual de deputados eleitos com parentes na política – o primeiro com 65%, e os outros dois com 60%. Verificando os maiores partidos, o PT é a legenda com percentual mais baixo (27%).
No Senado, as legendas com as maiores taxas de representantes com parentescos políticos são PMDB (89%), PP (80%), DEM (80%) e PSDB (70%), excluindo-se aqueles com apenas um representante – SD (100%).
Genética
Na Paraíba, o deputado federal mais votado foi Pedro Cunha Lima (PSDB-PB), de 26 anos. Ele é filho do senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), ex-governador do estado. A família Cunha Lima forma um dos clãs mais fortes da região: o avô de Pedro, Ronaldo Cunha Lima, também foi governador da Paraíba e senador pelo estado.
“É inegável que essa votação não é minha. Essa votação é de um trabalho pretérito que só aumenta a minha vontade e minha responsabilidade de mostrar que tenho a capacidade de contribuir”, explicou Pedro, cujo primo era vereador de Campina Grande e recém-eleito deputado estadual. Um dos seus tios foi o ex-deputado e ex-senador Ivandro Cunha Lima.
Caso semelhante é o do deputado federal Arthur Bisneto (PSDB-AM), de 35 anos, que é filho do ex-senador e atual prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto (PSDB-AM), e neto do ex-senador Arthur Virgílio.
Outra situação parecida envolve a família Alves no Rio Grande do Norte. O deputado de primeiro mandato Walter Alves (PMDB-RN) manterá o nome da família na Câmara. Ele é primo em segundo grau de Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), ex-presidente da Casa, que foi deputado por 10 legislaturas. Walter é filho do senador Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), ex-ministro da Previdência, e neto do também senador licenciado Garibaldi Alves (PMDB). É ainda primo do prefeito de Natal, Carlos Eduardo (PDT).
O deputado e empresário Expedito Netto (SD-RO), também de 26 anos, é filho de Expedito Junior (PSDB-RO). O deputado e estudante de Direito Marco Antônio Cabral (PMDB-RJ), de 23 anos, é filho do ex-senador e ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (PMDB-RJ).
Parlamentar mais jovem do Congresso, o deputado e estudante de Agronomia Uldurico Junior (PTC-BA), de 22 anos, é filho do ex-deputado federal Uldurico Pinto – seu avô materno também foi deputado federal.
A deputada Clarissa Garotinho (PR-RJ), de 32 anos, é filha dos ex-governadores e ex-parlamentares Anthony e Rosinha Garotinho. Foi deputada estadual e segue os passos dos pais com críticas firmes ao governo federal e também ao ex-governador do Rio Sérgio Cabral.
Herança
O único senador eleito em 2014 pelo Solidariedade (SD), Vicentinho Alves (TO), é primo do ex-prefeito de Porto Nacional (TO) Paulo Mourão (PT-TO). É pai do deputado federal eleito em 2014 Vicentinho Júnior (PSB-TO). Dos cinco parlamentares mais jovens, alguns estão entre os mais votados do país.
A apresentadora de TV Brunny (PTC-MG), de 25 anos, é casada com o deputado estadual e empresário Hélio Gomes (PSD-MG), que não conseguiu se reeleger. A senadora Nilda Gondim (PMDB-PB), que é suplente do José Maranhão (PMDB-PB), é mãe do senador nomeado para o Tribunal de Contas da União Vital do Rêgo e do deputado federal Veneziano Vital (PMDB-PB).
Reeleito como mais votado do Rio de Janeiro, o deputado federal Jair Bolsonaro (PTB-RJ) terá ao seu lado o filho Eduardo Bolsonaro, de 33 anos, eleito pelo PSC de São Paulo. Na esfera estadual, há, ainda o deputado estadual Flávio Bolsonaro (PP-RJ). A família é conhecida pelas propostas controversas e, por vezes, preconceituosas.
Quinta geração
Nenhuma família, porém, supera a família Andrada, cujo integrante mais ilustra foi José Bonifácio de Andrada e Silva, tutor de Dom Pedro II quando criança e conhecido na história como o Patriarca da Independência. O deputado federal Bonifácio Andrada (PSDB-MG), de 84 anos, integra a quinta geração de parlamentares brasileiros da família Andrada, descendentes de José Bonifácio. Praticamente toda a família é ligada à política brasileira desde o século XIX. A antiguidade dos Andrada na política brasileira é tão grande que o primeiro político da linhagem foi parlamentar não no Brasil, mas em Portugal. Depois da Revolução do Porto, em 1820, houve em Portugal uma assembleia constituinte, da qual fizeram parte representações parlamentares das colônias. Na representação brasileira, estava Antonio Carlos de Andrada, irmão de José Bonifácio.
Mais famoso representante da linhagem, José Bonifácio apoiou a regência de D. Pedro I, organizando ações militares contra os focos de resistência à separação de Portugal. Chegou a ser banido do país, mas depois se reconciliou com o imperador, assumindo a tutoria de D. Pedro II.
O atual Andrada deputado federal é filho do ex-deputado federal José Bonifácio Lafayette e sobrinho-neto do ex-governador Antônio Carlos Ribeiro de Andrada. É pai do deputado estadual reeleito Lafayette de Andrada (PSDB-MG), do atual prefeito de Barbacena, Toninho Andrada (PSDB-MG), do ex-prefeito de Barbacena Martim Andrada e do ex-vereador José Bonifácio Borges Andrada – atual subprocurador Geral da República.
Por Renata Giraldi, Foto Online