Presidencialismo de coalizão emperra, e sobrenomes se perpetuam no poder em meio a crise de representatividade
O sistema político brasileiro enfrenta um esgotamento funcional. O presidencialismo de coalizão, sustentado por acordos entre dezenas de partidos, revela-se caro, ineficiente e incapaz de entregar políticas públicas estruturantes. Enquanto isso, o poder político se torna cada vez mais hereditário, com filhos, irmãos e cônjuges de políticos ocupando mandatos e cargos estratégicos.
Na Câmara dos Deputados, pelo menos um terço dos parlamentares eleitos em 2022 é parente direto de políticos que já exerceram funções eletivas. A mesma tendência se repete em assembleias estaduais, câmaras municipais e até em prefeituras — onde filhos de ex-prefeitos, esposas e irmãos assumem a administração pública como continuidade de projetos familiares.
Política como carreira e patrimônio
O que se observa é a consolidação de uma lógica onde o mandato vira herança, repassada entre gerações com base em capital político, influência local e uso de recursos públicos. Em muitos casos, as campanhas se apoiam em estruturas já consolidadas, dificultando a renovação de nomes e propostas.
Essa profissionalização familiar da política reforça o distanciamento entre representantes e representados. A população vê sobrenomes repetidos, mas não percebe renovação de ideias nem avanços concretos.
Presidencialismo de coalizão emperra decisões
Além da concentração de poder em clãs políticos, o modelo institucional brasileiro enfrenta outro problema crônico: o presidencialismo de coalizão. Com mais de 30 partidos no Congresso e um orçamento pulverizado por emendas parlamentares, a governabilidade depende de negociações constantes e opacas, que atrasam ou impedem reformas.
Para garantir maioria no Legislativo, presidentes precisam distribuir cargos e verbas, transformando ministérios e autarquias em espaços de barganha. Isso fragiliza o Executivo e dá poder excessivo a bancadas regionais ou temáticas.
Oligarquias eleitorais e uso da máquina pública
Com baixa fiscalização e regras flexíveis sobre sucessão eleitoral, muitos desses grupos familiares utilizam estruturas estatais e redes de influência para manter sua presença no poder. Emendas parlamentares, convênios e nomeações funcionam como ferramentas de consolidação política local.
Nos municípios, a lógica se repete. Prefeitos eleitos abrem caminho para cônjuges, filhos ou sobrinhos, mantendo o controle da máquina pública por décadas. Em alguns casos, até vice-prefeitos de cidades pequenas realizam viagens internacionais com recursos públicos, enquanto os serviços básicos seguem precários.
Falta de renovação e baixa diversidade
O sistema também falha em garantir pluralidade. Mulheres, negros, indígenas e jovens seguem sub-representados nos parlamentos e nos executivos. A política se torna espaço de reprodução de poder, e não de representatividade. A consequência é uma crise de legitimidade democrática: a população vota, mas não se sente representada.
Conclusão
O Brasil vive um paradoxo. Tem uma democracia formal, mas com funcionamento oligárquico e baixa eficácia institucional. A política deixou de ser espaço de transformação coletiva e se consolidou, em muitos casos, como meio de vida para famílias com tradição eleitoral.
Enquanto faltam políticas públicas de qualidade, sobra estrutura para preservar dinastias eleitorais. A conta, como sempre, fica para o contribuinte.
Folha de Brasília, Da redação