A determinação para que a Polícia do Distrito Federal explique, em 24 horas, a demora no retorno de Jair Bolsonaro ao seu condomínio após exames hospitalares é mais um episódio que coloca a Justiça e a segurança pública sob os holofotes. À primeira vista, pode parecer uma medida de rotina: o STF exigindo transparência sobre procedimentos que envolvem um ex-presidente em prisão domiciliar. No entanto, a forma como a situação ganhou repercussão nacional levanta questões sobre o grau de rigor e a dimensão política das decisões que cercam Bolsonaro.
O debate não é sobre minutos a mais no trajeto, mas sobre a linha tênue entre garantir o cumprimento da lei e transformar cada detalhe em espetáculo. A preocupação do Supremo é compreensível: qualquer desvio, mesmo logístico, pode ser interpretado como privilégio ou descumprimento das condições impostas. Mas, ao mesmo tempo, o excesso de microgestão judicial corre o risco de reforçar o discurso de perseguição que sustenta a narrativa bolsonarista. Nesse sentido, a Justiça pode acabar fortalecendo exatamente a retórica que pretende combater.
O caso expõe a dificuldade do Estado em lidar com figuras públicas que carregam forte peso político. Tratar Bolsonaro como um réu comum é necessário para reafirmar a igualdade perante a lei, mas é inevitável que cada decisão seja politizada. A maturidade institucional será testada não na velocidade das respostas, mas na capacidade de equilibrar rigor, proporcionalidade e sobriedade. Caso contrário, a democracia brasileira corre o risco de se perder na gestão de detalhes, enquanto as questões realmente estruturais seguem em segundo plano.
Da redação, Folha de Brasília
Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil