O lançamento de um videogame brasileiro que tem um menino Yanomami como herói representa um marco simbólico importante para a produção cultural do país. Em um mercado dominado por narrativas estrangeiras, estereotipadas ou distantes da realidade nacional, a escolha de um personagem indígena rompe com padrões tradicionais e introduz uma perspectiva raramente retratada na indústria dos games. Entretanto, mais do que uma inovação estética, o jogo abre debate sobre representatividade, apropriação cultural e a responsabilidade de retratar um povo historicamente violentado, negligenciado e silenciado pelo Estado brasileiro.
A iniciativa tem sido celebrada, mas também exige crítica. Transformar a luta Yanomami em entretenimento traz riscos se o conteúdo não for tratado com rigor histórico e sensibilidade social. A população Yanomami enfrenta desnutrição, invasões ilegais, devastação ambiental e uma crise humanitária permanente; por isso, retratá-la apenas como elemento fantástico pode esvaziar a gravidade real do que ocorre na floresta. A potência do jogo reside justamente em sua capacidade de educar ao mesmo tempo em que entretém — e isso exige pesquisa, diálogo com lideranças indígenas e compromisso ético com a narrativa. Sem isso, corre-se o risco de transformar dor em produto.
O videogame, entretanto, também revela a força criativa do mercado nacional. Ele demonstra que a cultura brasileira pode produzir obras relevantes e, ao mesmo tempo, provocar reflexão. A presença de um menino Yanomami como herói desafia estereótipos, questiona a invisibilização indígena e cria oportunidade para que novos públicos conheçam e valorizem essas culturas. Se bem conduzido, o jogo pode se tornar não apenas um produto de entretenimento, mas um instrumento político e educativo de grande impacto. Cabe agora à indústria, aos criadores e ao Estado garantir que a representatividade não seja apenas estética, mas também transformadora.
Da redação, Folha de Brasília.
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