A declaração de que Hugo Motta, presidente da Câmara dos Deputados, pretende colocar em votação um projeto de anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro, com relatoria atribuída a um partido de centro, expõe a face mais perversa da política brasileira: a tentativa de reescrever a história por conveniência. Ao transformar em pauta legislativa o que deveria ser matéria exclusiva de Justiça, o Congresso arrisca jogar no lixo um dos processos mais importantes de responsabilização democrática do país.
A anistia, nesse contexto, não é apenas uma medida de clemência, mas um recado perigoso. Se aprovada, sinalizará que ataques às instituições podem ser relativizados conforme os ventos políticos. Pior: transformará em moeda de barganha um episódio que deveria servir como lição definitiva contra o autoritarismo. Ao entregar a relatoria a um partido de centro, a manobra tenta vestir-se de neutralidade, mas na prática busca apenas diluir responsabilidades e legitimar um acordo que interessa sobretudo ao bolsonarismo e seus aliados.
O risco é duplo. Primeiro, de enfraquecer a confiança da população nas instituições, que verão punições severas sendo anuladas por conveniência parlamentar. Segundo, de abrir precedente para novos ataques, já que os futuros conspiradores saberão que sempre haverá espaço para perdão legislativo. O Brasil não precisa de anistia para golpistas: precisa de memória, de punição proporcional e de instituições que se mantenham firmes diante da pressão política. Qualquer passo em contrário será lido pela história não como gesto de reconciliação, mas como cumplicidade.
Da redação, Folha de Brasília
Foto: Lula Marques/Agência Brasil







