A recomendação da Procuradoria-Geral da República para ampliar o monitoramento sobre Jair Bolsonaro, uma semana antes do julgamento do suposto golpe de Estado, é um movimento que revela tanto a fragilidade quanto a cautela das instituições brasileiras. De um lado, há a necessidade óbvia de evitar qualquer articulação paralela que possa tumultuar o processo judicial. De outro, a medida expõe um país ainda incapaz de lidar com naturalidade com seus fantasmas autoritários, tratando o ex-presidente como ameaça constante mesmo em prisão domiciliar.
A decisão pode ser justificada pela gravidade do caso: Bolsonaro não é um réu qualquer, mas um ex-chefe de Estado acusado de conspirar contra a democracia. Porém, o reforço no monitoramento escancara também a falta de confiança das instituições na sua própria capacidade de impor limites. Se o sistema jurídico e policial não conseguem garantir que um réu de tamanha notoriedade cumpra suas restrições, que mensagem resta para a população? Que vivemos em um Estado onde a lei vale menos para os poderosos e precisa de medidas excepcionais para ser aplicada.
Mais do que aumentar vigilância, o que se espera das instituições é firmeza e clareza. O julgamento de Bolsonaro deve ser conduzido com transparência, provas consistentes e prazos razoáveis. Transformar o processo em espetáculo midiático ou em campo de manobra política seria um erro tão grave quanto a própria acusação que o ex-presidente enfrenta. O Brasil precisa mostrar que é capaz de punir abusos sem hesitação, mas também sem arbitrariedade. Caso contrário, o monitoramento ampliado se tornará apenas mais um sintoma de uma democracia que ainda não sabe como lidar com seus inimigos internos.
Da redação, Folha de Brasília
Foto: Wilton Júnior/Estadão Conteúdo