A aprovação do chamado PL da Dosimetria pela Câmara reacendeu um debate político e jurídico de grande impacto: afinal, a mudança pode colocar Jair Bolsonaro em liberdade caso seja condenado? A resposta, embora tecnicamente complexa, revela a dimensão política do projeto. O texto aprovado pretende impor critérios mais rígidos e previsíveis para fixação de penas, especialmente em crimes relacionados a organização criminosa, atos antidemocráticos e delitos de natureza coletiva. Na prática, cria limites para decisões consideradas amplas ou discricionárias do Judiciário, afetando diretamente réus enquadrados em investigações como as do 8 de janeiro.
O cerne da discussão é que o PL pode, sim, reduzir significativamente penas aplicadas em casos de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito — tipificação central nos processos que envolvem aliados e assessores do ex-presidente. Caso Bolsonaro venha a ser denunciado e condenado por envolvimento em tramas golpistas, a nova legislação, se sancionada, poderia, em tese, diminuir a pena-base ou impor parâmetros que limitem a autonomia do STF na dosimetria. Não se trata de anistia explícita, mas de uma mudança estrutural que altera o cálculo das penas e, portanto, o tempo potencial de prisão. Críticos enxergam no projeto um “atalho legislativo” para mitigar consequências judiciais futuras.
Ainda assim, o efeito imediato é incerto. O STF pode interpretar que novas regras penais não retroagem para prejudicar o processo já em curso, ou pode entender que retroagem por serem normas mais benéficas — princípio basilar do Direito Penal. A disputa é, portanto, política e jurídica. A Câmara aprovou um texto que tenta impor limites ao Supremo, enquanto setores da oposição enxergam na proposta um mecanismo de proteção ao bolsonarismo. Mais do que um simples ajuste técnico, o PL da dosimetria simboliza a tensão entre Poderes e coloca o debate sobre liberdade do ex-presidente no centro da arena institucional. O Brasil segue assistindo à batalha entre política e Justiça, cada vez mais imbricadas.
Da redação, Folha de Brasília.
Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
