Enquanto trabalhadores enfrentam jornadas presenciais exaustivas, deputados federais poderão votar à distância antes do recesso parlamentar
Brasília (DF) – Enquanto milhões de brasileiros seguem enfrentando jornadas exaustivas de oito horas de trabalho presencial — lidando com transporte público precário, calor extremo e insegurança urbana —, a Câmara dos Deputados autorizou o voto remoto nesta última semana antes do recesso legislativo. A medida, embora defendida como estratégia para garantir quórum e acelerar votações, reforça o distanciamento entre representantes e representados.
Com a decisão da Mesa Diretora, os parlamentares agora podem votar de casa ou de onde estiverem, por meio de aplicativos como o Infoleg. Enquanto isso, grande parte da população sequer dispõe de internet estável para realizar tarefas básicas. O trabalhador comum, sem direito a “voto remoto”, é forçado a manter sua produtividade sob condições adversas — e sob o risco constante do desemprego. A disparidade revela um padrão de privilégios desconectado da realidade social do país.
Em democracias como Estados Unidos, Alemanha e Japão, parlamentares contam com estrutura, mas enfrentam regras rígidas de produtividade e transparência. No Brasil, o pacote de benefícios de um deputado — que inclui salário superior a R$ 39 mil, auxílio-moradia, passagens aéreas e verba de gabinete — pode facilmente superar US$ 7 mil líquidos por mês, valor maior que o da maioria das nações desenvolvidas. Além disso, o Congresso brasileiro usufrui de longos recessos, algo impensável em muitos parlamentos internacionais.
O que está em discussão vai além da funcionalidade legislativa: trata-se da legitimidade percebida pela população. Ao flexibilizar sua presença física enquanto exige sacrifícios do cidadão comum, o Parlamento nacional aprofunda uma lógica de casta política, sustentada por recursos públicos e distante da realidade do eleitor. A democracia enfraquece quando seus representantes vivem sob regras que jamais se aplicariam ao povo que os elegeu.
Folha de Brasília, Da redação







