Foto: João Viana / Semcom
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IBGE: apesar da queda acentuada da pobreza, desigualdades se mantêm

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IBGE: apesar da queda acentuada da pobreza, desigualdades se mantêm

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou um novo estudo nesta sexta-feira (25), revelando uma significativa queda na pobreza com base nos dados dos biênios 2008-2009 e 2017-2018. Entretanto, os resultados também indicam a manutenção das desigualdades estruturais. As diferenças entre os grupos pouco se alteraram, tanto na comparação entre populações urbanas e rurais, quanto no recorte racial.

O IBGE examinou indicadores não monetários de pobreza e qualidade de vida, utilizando dados de duas edições diferentes da Pesquisa de Orçamentos Familiares: uma de 2008-2009 e outra de 2017-2018. O estudo introduz três novos índices estatísticos e está em fase de teste e avaliação, sendo classificado como investigação experimental.

O estudo concentra-se nos grupos populacionais que apresentam privações na qualidade de vida, avaliando seis dimensões: moradia, acesso a serviços públicos, saúde e alimentação, educação, acesso a serviços financeiros, padrão de vida, transporte e lazer. Em cada dimensão, vários itens são examinados para investigar pobreza e vulnerabilidade, considerando a estrutura do domicílio, condições ambientais, acesso a eletricidade, saneamento, frequência escolar, posse de bens duráveis, uso de serviços financeiros, tempo de deslocamento para o trabalho, entre outros.

Na primeira etapa do estudo, foi feito um levantamento das pessoas com algum grau de pobreza no Brasil, considerando as seis dimensões avaliadas. Essa população diminuiu significativamente durante o período analisado. Em 2008-2009, 44,2% das pessoas no país enfrentavam algum grau de pobreza, número que caiu para 22,3% em 2017-2018.

O levantamento também evidencia diferenças notáveis entre áreas urbanas e rurais. Em 2017-2018, 17,3% das pessoas em áreas urbanas estavam em algum grau de pobreza, em comparação com 51,1% na população rural. No entanto, esse último número é consideravelmente menor que os 77,8% registrados em 2008-2009. A queda nas áreas urbanas também foi marcante, passando de 37,3% em 2008-2009 para o patamar de pobreza em 2017-2018.

Na segunda etapa, os pesquisadores buscaram dados para compreender essas mudanças de maneira mais abrangente, introduzindo novas formas de avaliação. O Índice de Pobreza Multidimensional não Monetário (IPM-NM) foi uma dessas abordagens. Ele foca nos casos de privações mais severas e procura identificar a intensidade da pobreza em cada grupo estudado. Um ponto de corte foi estabelecido: indivíduos com mais de um terço das privações de qualidade de vida foram considerados.

Leonardo Santos de Oliveira, pesquisador do IBGE, explicou que a metodologia foi utilizada para obter uma medida mais precisa ao comparar o Brasil em 2008/2009 e em 2017/2018. Ele ressaltou que a intensidade da pobreza não pode ser compreendida apenas pela proporção de pessoas em algum grau de pobreza. A pesquisa revela que a perda de qualidade de vida é mais acentuada quando há muitas privações em contraste com os casos de poucas privações.

Entre 2008-2009 e 2017-2018, o IPM-NM caiu de 6,7 para 2,3, representando uma redução de 65%. Esses resultados indicam uma diminuição mais acentuada da pobreza do que a análise superficial dos dados sobre pessoas em algum grau de pobreza sugeriria. A queda foi mais notável nas áreas urbanas (66%) em comparação com as áreas rurais (59,5%).

O estudo destaca a persistência da desigualdade estrutural. Embora representando apenas 15% da população do país em 2017-2018, as áreas rurais contribuíram com 40,5% para o resultado do IPM-NM. Em 2008-2009, essa contribuição era de 40,2%, indicando estabilidade.

Quanto à divisão por regiões, o Norte e o Nordeste apresentaram os maiores valores de IPM-NM em ambos os períodos, embora tenham observado melhorias significativas. No Norte, o IPM-NM caiu de 13,8 em 2008-2009 para 5,2 em 2017-2018. No Nordeste, a queda foi de 12,4 para 4,3.

Uma análise também foi conduzida com base na cor ou raça. O IPM-NM para a população de referência branca diminuiu em 62,1%. Já para a população de referência preta ou parda, o índice caiu de 9,6 para 3,2, uma redução percentual de 66,6%. Contudo, essa redução não foi suficiente para eliminar a diferença na pobreza entre famílias com pessoa de referência branca e aquelas com pessoa de referência preta ou parda.

O estudo também mostra que o IPM-NM para a população preta ou parda permaneceu acima da média nacional. Além disso, a contribuição desse grupo para o índice nacional aumentou, passando de 75,7% em 2008-2009 para 79,1% em 2017-2018. De acordo com a pesquisa, esses resultados indicam que a desigualdade estrutural não mudou, apesar da redução do IPM-NM.

No recorte por nível de escolaridade, observa-se que o subgrupo sem instrução teve uma queda de 56% no IPM-NM. Entre aqueles com ensino fundamental incompleto ou completo, a redução foi de 59%.

Vulnerabilidade

O estudo também avaliou o Índice de Vulnerabilidade Multidimensional não Monetário (IVM-NM). Esse índice utiliza um ponto de corte mais baixo, considerando pessoas com mais de um sexto das privações de qualidade de vida relatadas. Isso engloba um contingente populacional mais amplo do que o IPM-NM.

Os resultados mostram que entre os períodos de 2008-2009 e 2017-2018, o IVM-NM diminuiu de 14,5 para 7,7, representando uma redução de 47%. Mais uma vez, as quedas foram distintas entre áreas urbanas (48,1%) e rurais (39,4%). Também foi notado que a diminuição da vulnerabilidade foi um pouco mais pronunciada na população de referência de cor branca (50%) em comparação com a população de referência de cor preta ou parda (47,3%).

O estudo também apresentou resultados para o Índice de Pobreza Multidimensional com Componente Relativo (IPM-CR). Nesse caso, não é utilizado um ponto de corte, mas sim uma identificação e agregação baseada em comparações.

Segundo Leonardo Santos de Oliveira, pesquisador do IBGE, “Basicamente, perguntamos para cada pessoa qual é o seu grau de perda e quantas pessoas têm um grau de perda acima de você. Isso é levado em consideração. Depois, perguntamos para a próxima pessoa. É justamente por causa dessa comparação pessoal que você passa a ter um indicador com um componente relativo de pobreza.”

A perspectiva do IPM-CR também demonstra uma melhoria para o Brasil entre os períodos de 2008-2009 e 2017-2018. O índice teve uma queda de 20%, passando de 15 para 12. No entanto, a análise oferece uma leitura diferente na comparação entre áreas urbanas e rurais, onde ambas tiveram reduções semelhantes: 18,5% no primeiro caso e 18,8% no segundo.

Na análise por cor ou raça, os dados também fornecem uma nova perspectiva. No grupo com pessoas de referência de cor preta ou parda, o índice caiu de 18,7 para 14,4, o que representa uma redução de cerca de 23%. Já no grupo com pessoas de referência de cor branca, a queda foi de 17,6%, passando de 10,8 para 8,9.

Os pesquisadores afirmam que os resultados refletem a persistência da desigualdade entre essas populações, uma vez que as contribuições para o índice nacional pouco mudaram. O grupo com pessoas de referência de cor preta ou parda contribuiu com 68,4% do IPM-CR total em 2017-2018. Isso representa um aumento leve em comparação com 2008-2009, quando essa contribuição foi de 65,4%.

De acordo com os pesquisadores, tanto o IPM-CR quanto o IPM-NM e o IVM-NM apontam para uma forte redução da pobreza e da vulnerabilidade. No entanto, também indicam que os maiores valores continuam concentrados nos segmentos menos favorecidos, reforçando a presença de um componente estrutural da desigualdade. Além disso, observam que, ao analisar os três índices, as dimensões “acesso aos serviços financeiros e padrão de vida” e “educação” tiveram um impacto maior, embora não muito diferente das outras dimensões, reforçando a natureza multidimensional da pobreza e da vulnerabilidade.