Quatro alunos do Colégio Militar de Brasília foram aprovados em universidades de prestígio nos Estados Unidos neste ano. Em um dos casos, um aluno recebeu a confirmação de que tinha passado em Harvard na mesma semana em que o irmão mais velho terminava a graduação na universidade americana.
Vitor Freitas, de 18 anos, havia sido selecionado para cursar economia na Universidade de Cornell, em Nova York, e estava na lista de espera para a seleção de Harvard, em Cambridge. “Eu voltei para o Brasil no domingo da formatura do meu irmão e recebi a notícia com surpresa. Ainda estou em choque”, contou.
“É a universidade que eu sempre quis, estava bem feliz com as outras, mas era a que eu sempre quis mesmo. Estou bem feliz e é bom que eu já conheço a universidade, conheço a cidade por causa do meu irmão, então é bem melhor.”
A mãe de Vitor, a aposentada Vânia Freitas, afirmou que os dois filhos sempre estudaram em escola pública, e que ficou emocionada com a notícia. “É inacreditável, primeiro um orgulho. É um feito”, disse.
Vitor e o irmão, de 22 anos, foram alunos do Colégio Militar de Brasília, que é público. A instituição está entre os 30 colégios da capital federal com maior nota no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Em 2013, ocupou a 17ª posição.
Depois que o irmão de Vitor passou em Harvard, estudantes da instituição se inspiraram na aprovação do jovem e começaram a investir na possibilidade de estudar fora do país, disse. Com isso, outros três amigos dele foram selecionados para estudar em diferentes universidades dos Estados Unidos a partir de agosto deste ano.
“Sempre pensei em estudar fora, mas não sabia que era possível. Quando meu irmão passou em Harvard, vimos que não era um sonho tão difícil. Ele foi uma motivação para mim e para muitos alunos, afirmou Vitor.
Ele e os três amigos – Luiz Felipe Gomide, de 18 anos, Nathalya Leite, de 18, e Juliana Chen, de 17 – se conheceram em 2008, quando ingressaram no colégio para cursar o 6º ano do ensino fundamental. Aprovado na Universidade de Notredame, em Indiana, Luiz Felipe Gomide, de 18 anos, vai cursar economia internacional.
Ele contou que em 2011 começou a participar de simulações da ONU e que, no final do ano seguinte, visitou o campus de Harvard. “Fizemos um tour por lá e vi que aquilo era possível. Vi que era algo próximo de mim e que também poderia conseguir.”
O estudante afirma que, além de investir nos estudos, as pessoas que têm o mesmo sonho têm que traçar objetivos. “É lógico que conta ter um currículo com notas boas, mas é preciso investir em atividades extras. Pratiquei vários esportes, participei de bandas, teatro e até coral”, contou. “No coral não me dei bem e fui expulso por cantar mal, mas tentei. Tem que equilibrar o lazer com os estudos e com a pesquisa para ver qual universidade você se encaixa melhor.”
As amigas Nathalya Leite e Juliana Chen passaram juntas para engenharia biomédica na Universidade de Yale, em Connecticut. Nathalya falou que seu ponto fraco durante a seleção foi o inglês e que, por isso, investiu várias horas do dia para estudar a língua.
Nathalya disse que é a primeira integrante da família a ter nível superior. “Sou filha única e os meus pais não fizeram faculdade. Meu pai conseguiu a vida que ele queria na Aeronáutica e minha mãe deixou de trabalhar para cuidar de mim”, afirmou. “Já estou ficando com saudades da família, fico me despedindo toda hora do pessoal, é um sentimento de querer muito ir, mas também quero ficar com a minha mãe, sou muito apegada a ela.”
Juliana falou que teve que convencer os pais a deixarem estudar fora do país. “Eles queriam que eu ficasse aqui e eu os convenci. Depois que consegui entrar eles ficaram muito felizes”, disse.
Ela contou que o pré-requisito estipulado pela família para morar fora era que ela passasse em um vestibular no Brasil. Além de ter sido selecionada para Yale, a jovem foi aprovada em medicina na Universidade de Brasília. “A gente tem que decidir essas coisas da vida. Eu passei no meio do terceiro ano. O colégio prepara para tudo, muitas pessoas passaram para medicina.”
Perfil
Nathalya afirmou que o processo para entrar em uma universidade americana é longo, mas não tão impossível como muitos imaginam. Ela explicou que as universidades dos Estados Unidos não estão interessadas somente em notas altas. “As universidades americanas querem saber como você é como pessoa. Acho isso sensacional. Às vezes as pessoas não se destacam bem nas notas, mas gostam de artes, de esportes, e eles valorizam isso.”
Uma das etapas do processo de seleção inclui redações em inglês. Esses textos, segundo a estudante, devem explicar o porquê o jovem acha que se encaixa no perfil da faculdade. “Nessas redações você tem que falar o que você é, o que você aprendeu, o que você quer ser no futuro, o que aprendeu com seus erros e eles querem saber o que você se tornou até hoje e o que você quer se tornar no futuro”, disse Nathalya.
Juliana escolheu em qual universidade gostaria de estudar depois que um amigo mostrou um vídeo sobre Yale. “Sou fã de Harry Potter e o estilo da academia influenciou, mas lógico também que Yale é uma das melhores universidades do mundo, ainda mais para a área que quero estudar”, disse.
Expectativas
Os quatro amigos foram unânimes ao afirmar que gostariam de trazer alguma contribuição para o Brasil ao estudarem fora do país. Freitas falou que tem como objetivo incentivar a educação no Brasil. “Falta no ensino público e privado atividades extracurriculares. Tem que valorizar mais o que os estudantes fazem e não só as provas”, disse.
Para Nathalya, o país carece de investimentos em pesquisa. “Eu pretendo trabalhar em pesquisa, então quero fazer mestrado e doutorado lá e depois voltar para o Brasil. Aqui não investem muito em pesquisa. Quero desenvolver pesquisas na área de engenharia biomédica, que é muito escassa.”
Gomide acredita que a oportunidade em Notredame vai aumentar os contatos e o portfólio dele. “Por ser um curso conhecido como o melhor acho que vai me ajudar muito em conseguir emprego lá e aqui. Talvez quero voltar para o Brasil. Quero trabalhar aqui ou lá na parte de consultor internacional por algo no Brasil”, disse.
Ele afirmou que os estudantes não buscam uma “fuga do país” quando escolhem estudar fora. “A gente não quer ser visto como uma fuga de mentes. A gente quer ir para fora, buscar uma educação de qualidade e trazer para o Brasil. Refletir um pouco o que a gente aprendeu, sendo voltando como professor, trazer mais investimento, mais empresas.”
Programa
Os estudantes que vão para os Estados Unidos fizeram parte de um programa de seleção da Fundação Estudar. A fundação busca orientar os alunos desde o primeiro ano do ensino médio para que eles encontrem a melhor universidade possível para o perfil e o curso que querem.
O programa é aberto a jovens que estão no terceiro ano ou recém-formados que pretendem se candidatar a uma vaga. Segundo a consultora de estudos da fundação, Carolina Lyrio, cerca de 50 brasileiros são selecionados por ano pelo programa.
“A primeira parte é entender o processo, não é como no Brasil que só faz uma prova, lá eles consideram histórico escolar, carta de recomendação de professores e coordenador de um colégio, atividades extracurriculares, prêmios e honras e o que eles chamam de qualidades pessoais, coisas meio intangíveis, mas basicamente se o aluno tem o perfil da universidade e se a universidade tem o perfil do aluno”, explicou.
Durante o ano, representantes da fundação fazem visitações nos colégios contando sobre experiências fora do país, sobre programas. “É mais um trabalho de divulgação. Às vezes a gente trabalha com os alunos para montar estratégias de estudo, como ele pode melhorar.”
Carolina contou que o processo para conseguir bolsas pela fundação é igual para todos. “Procuramos brasileiros líderes transformadores e a missão da Estudar é potencializar jovens talentos. A gente acredita que esses brasileiros agindo grande conseguem melhorar o país.”
G1